amo o outono nesta cidade
as pequenas casas de raras cores
os campos de vinhas e cana-de-açúcar os pomares entre maio e
agosto.
Dizes:
Eis a tua cidade
a de zarco e colombo
as ruas estreitas tão inclinadas como o sol dos invernos profundos
os carros de cestos os caminhantes da encumeada.
eis-te no centro de tudo e os navios parados.
amo o outono nesta cidade com todas as viagens sem chegada.
na véspera já amara as verdes montanhas de leste
as chuvas abundantes
machico entre os seios de ana d`arfert.
depois voltei para sul e amei-te enquanto cantavas.
século antes navegadores de portugal deram-te um nome e
era funchal.
depois queimaram as árvores e o mais alto incêndio era uma ilha.
escravos errantes pararam o sol e à volta serenamente e sem paixão
espalharam o verde o azul.
nunca cantaram a alegria.
hoje
solitários e ébrios trabalham a pedra a beleza e o turismo
tu
envolta nas lendas e no sonho surgiste devagar e devagar
deste-me os mais belos frutos e os mais estranhos
as pitangas os araçás os maracujás e as romãs muito depois
da primavera.
eras mulher e quis guardar-te para sempre no coração de uma
cidade surpreendida.
foi então que vi a morte aproximar-se vinda do horizonte e
cobrir o pôr do sol das tuas tardes
vi morrer a água a luz a leve sombra de palidez da tua fronte
vi as aves marítimas seguirem para longe em voo raso
e pela última vez
definitivamente só
eu amei o outono nesta cidade.
José Agostinho Baptista in "Deste lado onde"
... é a cidade que se impõe em cada voo, que resgata todos os que partem, sejam os poetas que a entoam em versos, sejam os sonhadores que almejam dobrar o horizonte...
E os regressos, esses, são cercos ladeados de mar.
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