21/08/11

Por Bertold Brecht :


Quem Não Sabe De Ajuda
Como pode a voz que vem das casas
Ser a da justiça
Se os pátios estão desabrigados? Como pode não ser um embusteiro aquele que
Ensina os famintos outras coisas
Que não a maneira de abolir a fome? Quem não dá o pão ao faminto
Quer a violência
Quem na canoa não tem
Lugar para os que se afogam
Não tem compaixão. Quem não sabe de ajuda
Que cale.

14/08/11

Poema 20




Conheço as lágrimas.
As lágrimas do pó,
das mãos, das nuvens e da fala.
Com elas faço jóias, faço casas,
ofereço-as nas palavras
aos campos de silêncio que Deus lavra.

Joaquim Pessoa, in À MESA DO AMOR, Litexa, 1994

09/08/11

de Joaquim Pessoa:

Estava precisamente a dizer-te

que o meu coração tem um sorriso ao qual não

me oponho porque esse sorriso tem a forma de

um barco que desliza sobre qualquer "mar

de lágrimas". Fico satisfeito por teres perdoado

as minhas palavras. Cada uma delas quer ser melhor

que a outra. Sabes?, isto de ser poeta não é de facto

coisa que se recomende, e um verbo é como o vento.

Se alteras o tempo verbal, mudas a direcção do

vento, quero eu dizer, a direcção do pensamento. O que

canto não é o que cantei, e também decerto não será

o que cantarei um dia. Por isso, estava a dizer-te

que o meu coração sorri. E não sorri

apenas. Adora andar por aí, a assobiar

o futuro. Fazendo justiça

a quem me lê.



(Do livro a publicar, ANO COMUM

07/08/11

Estou triste e dói-me


Estou triste e dói-me
o coração tão fundo
que o grito coagula na garganta
...e não circula
mais.

Quando o punhal se crava
na grossa veia cava
e não retira
mortal a ferida sangra
e não para fora.

Agora é tanta
a dor que se não chora
que decanta
na ruga em vão do riso
um limo de soluços mineral.

Carlos Aboim Inglez

AS PESSOAS SENSÍVEIS

(surripiado ao "Cravo de Abril")


As pessoas sensíveis não são capazes
de matar galinhas
Porém são capazes
de comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
à roupa do seu corpo
aquela roupa
que depois da chuva secou no corpo
porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
a roupa
que depois do suor não foi lavada
porque não tinham outra

«Ganharás o pão com o suor do teu rosto»
assim nos foi imposto
e não:
«Com o suor dos outros ganharás o pão»

Ó vendilhões do templo
Ó construtores
das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor
porque eles sabem o que fazem